Gilberto Gil dá novos sentidos ao viver em noite inesquecível em Porto Alegre

Fotos: @pridiabr

Em uma noite gelada de sábado, Porto Alegre viveu um daqueles momentos que ficam gravados na memória coletiva. Gilberto Gil subiu ao palco do Estádio Beira-Rio para se despedir dos palcos gaúchos com o espetáculo “Tempo Rei”, diante de cerca de 30 mil pessoas, segundo a organização. Aos 83 anos, o baiano mostrou que o tempo, para ele, é apenas um detalhe: sua voz, sua presença e sua música continuam atravessando gerações com a mesma força e encantamento de sempre.

O show foi um mergulho profundo na obra monumental de Gil, conduzindo o público por mais de seis décadas de carreira em uma narrativa que uniu celebração, emoção e memória. Não foi apenas um espetáculo sonoro, mas também visual. A estrutura grandiosa, com painéis de LED em formato de vórtex, iluminação precisa e som impecável, criou o cenário perfeito para uma noite histórica.

Logo na abertura, Gil se apresentou como o menino de pouco mais de 20 anos que saía da Bahia para conquistar o mundo. “Palco” abriu a derradeira performance em Porto Alegre, com a alma do artista cheirando “a talco como bumbum de bebê”, como canta na canção. Em seguida, “Tempo Rei” brindou a celebração, aquecendo corações na noite fria e preparando o público para uma viagem pela história da música brasileira.

Entre sucessos, Gil contou histórias, revisitou memórias e trouxe ao palco as diferentes fases de sua carreira. Cantou suas influências com “Eu Só Quero um Xodó” (Dominguinhos), reviveu a efervescência da Tropicália com “Domingo no Parque”, “Eu Vim da Bahia” e “Procissão”, e conduziu a plateia por momentos emblemáticos da história do Brasil. “Cálice”, parceria com Chico Buarque, ecoou como um grito contra a ditadura, enquanto “Back in Bahia” traduziu a dor do exílio e a esperança de retorno.

O roteiro seguiu pela força criativa dos anos 70 com “Refazenda” e “Refavela”, mergulhou na fase reggae e pop dos anos 80 com “Extra”, “Vamos Fugir” e “A Novidade”, e abriu espaço para o Gil elétrico, com “Realce”, “A Gente Precisa Ver o Luar” e “Punk da Periferia” — esta última com participação surpresa da gaúcha Adriana Calcanhotto, arrancando aplausos entusiasmados.

Um dos momentos mais emocionantes da noite aconteceu quando Gil ficou sozinho no palco para interpretar “Se Eu Quiser Falar com Deus”. Em seguida, embalado pela saudade, cantou “Drão”, lembrando que essa foi a última música que apresentou ao lado da filha Preta Gil, falecida recentemente. O público respondeu com lágrimas, aplausos e luzes de celulares, transformando o Beira-Rio em um céu estrelado.

A reta final foi pura celebração. Com “Expresso 2222”, “Andar com Fé”, “Esperando na Janela” e o hino “Aquele Abraço”, Gil colocou as 30 mil pessoas para dançar, transformando o estádio em um grande baile de forró a céu aberto. O encerramento veio com a contagiante “Toda Menina Baiana”, deixando o público em êxtase e emocionado.

Mais do que um show, a apresentação de Gilberto Gil no Beira-Rio foi um ritual de celebração da vida, da música e da memória coletiva do Brasil. Aos 83 anos, o artista mostrou que sua obra continua viva, pulsante e atemporal. Porto Alegre se despede, mas o legado de Gil permanece eterno — um verdadeiro rei que desafia o tempo.