Exposição “Lojas Africanas: territórios de afeto” inicia no dia 18 de novembro, na CCMQ

Uma proposição artística que foi se materializando durante os encontros de serigrafia ministrados pela professora Nilza Haertel, no Instituto de Artes da UFRGS, em 2005. Hoje, após transcorrido algum tempo, o artista Leandro Machado novamente evoca a proposta Lojas Africanas e o conceito que tem orientado as suas ações com o intuito de construir, o mais coletivamente possível, meios que permitam agregar pessoas, pesquisas, práticas artísticas, resgates, construção de memória, sustentabilidade e economia solidária. A partir de 18 de novembro, na Casa de Cultura Mário Quintana (CCMQ) terá exposição dos artistas visuais afro-gaúchos escolhidos em cinco cidades representativas, onde eles se encontraram e realizaram rodas de conversa e análise coletiva de portfólios. A visita também pode ser feita virtualmente, pelo https://lojasafricanasarte.wixsite.com. Para ajudar na construção desses momentos, ambientando, resgatando conhecimentos e lutas, conectando a sabedoria ancestral do povo negro, buscar a vibração, a resistência, a força e a leveza presente no toque de um tambor. Em cada cidade foi realizada uma oficina para apresentar e praticar algumas das técnicas artísticas ligadas às artes gráficas (serigrafia, stencil, fanzine).

O objetivo do projeto é aproximar, conhecer, fomentar encontros nos quais novas produções possam surgir, listar, tornar pública a existência de artistas visuais afro-gaúchos que, em geral, habitam as periferias das cidades. O ato de descentralizar também aparece na perspectiva de colocar-se em relação com indivíduos de áreas da Região Sul/Pampa, distantes da Capital e muitas vezes igualmente distantes dos equipamentos culturais (museus, casas de cultura, ateliers, galerias de arte…). Do mesmo modo, deseja-se a aproximação, conexão dos que já vivem nesses espaços.

A relevância da realização desta proposta está no fato de que os afrodescendentes desejam ser os contadores da sua história, dando versão própria frente aos acontecimentos e preenchendo as lacunas que seguem abertas – também no sistema das artes – em número considerável. É possível citar exemplos de realidades próximas: no acervo do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – Ado Malagoli, dentro de um universo de 1066 artistas, somente 25 são negros artistas (sendo apenas duas as mulheres negras artistas).

Outro fato é que, apesar de a Instituição estar em atividade desde o ano de 1955, foram raras as vezes em que um artista afro-brasileiro teve a oportunidade de fazer uma mostra individual nas salas expositivas do Museu. A mais recente foi a que procurou dar um panorama da produção de Otacílio Camilo, com curadoria de Izis Abreu, no final de 2019, na qual Leandro Machado esteve como artista convidado dentro de um dos encontros promovidos pelo Seminário: Poéticas do Cotidiano.

No tocante à comunidade de artistas afro-gaúchos, Leandro percebe o seguinte: diferentemente dos que desenvolvem as suas pesquisas nas artes cênicas, na música, na dança, no cinema, muitos artistas visuais atuam solitários em seus “ateliês”. Dentre as causas possíveis estão as mais variadas formas de violência, mas também faz-se necessário atentar para a existência de um imaginário específico e distorcido – consolidado ao longo do tempo – de que é preciso estar encerrado em um espaço de trabalho, solitário, em busca da solução de questões formais e pessoais. Ademais, nos dias de hoje, praticamente já se vê com naturalidade o fato de que as relações entre as pessoas podem muitas vezes permanecer ao nível dos distanciamentos ocasionados pelos aplicativos e pelas redes sociais.

Mas se esses artistas não se conhecerem e não se procurarem e não conversarem entre si, tendo os olhos nos olhos, seguirão trabalhando em favor dos mesmos mecanismos e práticas que são promotores da exclusão, da invisibilidade, do apagamento de trajetórias. Também dificultando a possível construção de um pensamento coletivo/colaborativo/de apoio mútuo – um lugar e um tempo onde se possa compartilhar frustrações, preocupações, estratégias, conquistas. Aquilombar-se visa ao resgate de um ambiente de encontro, onde a conexão direta com o outro tenha restabelecida a sua relevância e os dispositivos digitais retornem à condição de ferramenta.

No desejo de construir conjuntamente o fomento para o convívio, o diálogo, a inclusão social, as trocas, a reflexão, o aprendizado, o estímulo, o incentivo à inovação, o desenvolvimento da criação artística, a divulgação/resgate de outros artistas e de suas respectivas propostas, busca-se o fortalecimento no tocante às questões que são caras à pessoa e a atuação profissional – o protagonismo coletivo e a possibilidade de construção de novas narrativas, outras bibliografias, outras discussões, outros lugares de fala.

Por: Juliana Leal